quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Resenha e análise psicológica do filme “O Despertar”. Dirigido por Nick Murphy.


            A trama trás já em sua abertura uma imagem de um olho que se abre, imagem esta que nos dá a impressão de penetrar neste olhar ao começar a assistir o filme.Esta cena inicial da impressão de se tratar de um sonho, ou alguém que desperta, porém parece não ser esta a questão, não um sonho, mas uma viagem ao interior de uma vida, de uma história.
O filme nos mostra a história de uma jovem e bela mulher cuja profissão é “caçar fantasmas”. Dedica-se a investigar e desvendar casos onde seres misteriosos estão presentes, onde ocorram possíveis manifestações sobrenaturais e a provar que no fundo não passam de imaginações das pessoas ou algum charlatão se aproveitando do medo ou da curiosidade alheia. No início do filme temos um exemplo deste trabalho. Nossa bela atriz cujo nome é Rebecca Hall interpretando o papel de Florence Cathcart, personagem principal, participa de uma mesa onde ocorre um ritual em que sacrificam um animal e clamam aos espíritos para trazerem de volta o espírito de uma menina a pedido de uma mãe desesperada. Durante a sessão onde todos participantes parecem estar em transe, nossa caça fantasmas interrompe a sessão e demostra que tudo não passa de uma farsa. A criança, que seria a menina que voltava do mundo dos espíritos era em si outra criança bem real que aparecia em um jogo de luzes e sombras. A vela que se apagava, possuía um mecanismo que permitia que isto acontecesse enfim, tudo não passava de um truque bem organizado. Porém a algo nesta cena que de certa forma passa despercebido, ou recebe pouca atenção de nós telespectadores. A senhorita Cathcart trás consigo uma foto, a foto de um soldado, seu ex-namorado a quem amava e que morreu em um campo de guerra. Porque Cathcart levava consigo esta foto num rito que clamava a volta de um espírito? Seria apenas uma forma de adentrar no ritual para investiga-lo, ou ela no fundo deseja que fosse real a possibilidade da volta de um espírito?
            De volta para casa Cathcart entra em seu quarto e é possível ver que se deprime, sua mãe a consola dizendo lhe que ela e seu pai respeitam este trabalho e que entendem que este de certa forma lhe da sentido a vida, porém não podem deixar também de perceber o quanto tal trabalho a faz sofrer. Cathcart chora um pouco, mas logo seca as lágrimas e se recompõe, pois, subitamente havia surgido alguém trazendo um novo caso a ser investigado. Minutos antes após ter resolvido um caso e chegar em casa, Cathcart recebe a visita de Robert Mallory, interpretado pelo ator Dominic West. Robert é um ex-combatente de guerra que se tornou professor de história e leciona em uma escola, na verdade uma espécie de orfanato onde um garoto havia sido encontrado morto e, segundo rumores, seu fantasma assombrava o local.
            Após titubear um pouco Cathcart aceita o caso, reúne todo seu aparato investigativo e parte para a escola. Cathcart, cética que é não acredita que espíritos assolassem o local. Ela arma então seu aparato e inicia a investigação. Na primeira noite em que realiza seu trabalho, descobre que dois garotos estão envolvidos no episódio, porém um deles ela não consegue identificar quem é. Com tal descoberta, o caso parece elucidado. Trata-se de uma armação de levados garotos que brincam em assombrar as pessoas, mas há algo mais. E o outro garoto? Quem é?
            Pronta a deixar o local, Cathcart se vê então muito mais envolvida com o caso do que talvez desejasse. Parece que realmente há espíritos assolando o local e uma serie de eventos dos quais suas técnicas e teorias não dão conta de explicar começam a surgir. A figura do outro menino, o qual não havia sido identificado, continua a aparecer e causar espanto a alguns. Nesta parte do filme a trama trás certo suspense a alguns mais sensíveis, como meu caso, provocando até certos arrepios. Pouco a pouco Cathcart vai enfrentando o medo que até mesmo ela sentia, e começa a descobrir sobre este SEU FANTASMA.
            Continuando a investigação, Cathcart descobre na casa uma escada secreta, descendo por esta, sai em um porão. Neste local a mesma se vê então frente a frente com o fantasma. Em meio a uma figura desconexa a imagem do menino se materializa. E começa um diálogo com Cathcart. “Olhe pela janela da casinha, olhe, dizia o menino. Você está tão próxima de descobrir, você chegou tão perto. Tenha coragem.” Após mais um vês relutar em enfrentar este FANTASMA Cathcart encara o medo de frente e olha pela pela janela da casinha de bonecas que havia no local.
            Olhando pela janela da casinha vê enfim aquilo que desvendaria o mistério. A imagem de uma garotinha amedrontada se materializa em sua mente e Cathcart enxerga a imagem de uma menina que presencia a mãe ser assassinada com um tiro disparado por seu próprio pai. Esta garotinha foge então do pai que também quer mata-la e se esconde debaixo de uma escada. Neste local onde se esconde está um menino, um filho bastardo que seu pai havia tido com uma empregada, logo, meio irmão da garota. Envoltos pelo medo os dois ficam escondidos, mas o próprio medo faz com a menina pegue um boneco para abraçar e ao fazê-lo, realiza um barulho. Neste momento, o pai dos meninos descobre o esconderijo e sem imaginar que seu filho também está lá, aponta sua arma e dispara contra o local. O tiro acerta de raspão o ombro da menina e vai em cheio contra seu irmão. Após ver seu filho cair morto por seu tiro, o pai põe fim a própria vida com um tiro na cabeça. A menina presencia também a morte do pai observando-o por uma fresta.
Ah!!! Vinha me esquecendo. Cathcart possuía uma cicatriz no ombro a qual até então dizia ser de um ataque sofrido por um leão, uma história construída não sei por quem, mas que Cathcart tinha como verdade. Porém agora, após olhar pela casinha, para seu passado, descobre-se como a figura central desta história. A cicatriz em seu ombro não fora provocada por um ataque de leão, e sim por um tiro direcionado a si, mas que acertou e matou seu irmão. A partir de então, já sem medo algum, descobre que o fantasma do menino, era em si o seu irmão assassinado.    Mas em fim, trata-se de um caso em que espíritos voltam para assolar a vida de uma pessoa ou não? Diversas são as possibilidades de interpretação para o caso, sigo portanto minha linha de pensamento a qual tem por base analítica a psicologia.
 O restante da história mostra que, a governanta da casa, Sra. Muad, interpretada pela atriz Imelda Staunton, esta inclusive foi quem indicou ao diretor da escola a Srta.Cathcart para elucidar o caso, era a mãe do garoto assassinado. Na época do ocorrido ela era empregada na casa. Após a morte do casal e também de seu filho, Cathcart foi então encaminhada para adoção. Desolada com o desfecho trágico da situação, Muad nunca aceitou que também a menina por quem tinha afeto lhe fosse tirada, a partir de então, Muad leva uma vida destinada a de alguma forma reunir seus entes queridos de volta. Assim como Cathcart, Muad também dialogava com seus fantasmas. Após Cathcart desvendar então este mistério, seus fantasmas, a governanta satisfeita por ter conseguido trazer de volta à casa a linda menina, resolve dar conclusão a seu plano delirante de reunir a sua volta aqueles a quem ama. Num momento em que dialoga com o espírito de seu menino e também com Cathcart, ela oferece a esta uma dose letal de um veneno, tomando em seguida também uma dose deste, assim se concluiria aquilo que acreditava, ou seja, viverem juntos para sempre no mundo dos espíritos.
Com a morte de Cathcart desaparecem de cena a figura fantasmagórica do menino e também da governanta, isto mostra que estes dois fantasmas somente existiam na mente das duas. Porém, a partir de agora surge um novo fantasma, o fantasma de Cathcart que pode dialogar exclusivamente com o professor Robert e com um menino da escola. Em comum, tanto o professor quanto o menino, tem uma história de vida traumática, assim como também Cathcart e a governanta Muad. Em comum estes quatro personagens tem a capacidade de dialogar com alguns mortos, seus fantasmas.
Análise psicológica.
Ouso por hora dar uma explicação em que me oriento em meus conhecimentos da psicologia para entender a questão.
Cathcart não buscava elucidar as questões relativas aos fantasmas alheios, buscava em si elucidar o drama de seus fantasmas. A escolha por esta profissão vem de encontro a seu desejo inconsciente. Cathcart não se lembra dos fatos ocorridos, quando solicitada a ir para a escola desvendar os fatos lá ocorridos, não consegue se lembrar que um dia havia morado ali, nem mesmo reconhece a governanta, pessoa de quem havia recebido cuidados quando ainda criança. Mas porque não se lembra? O mecanismo psíquico que ai entra em ação, me parece uma defesa onde os conteúdos traumáticos são recalcados. Em uma linguagem mais popular, as visões e sensações traumáticas, por tão dolorosas que são não serão lembradas, porém estarão em algum lugar do inconsciente da pessoa e surgirá como um sintoma. Quanto a profissão escolhida por Cathcart, a mesma não é tão escolhida assim, era uma busca inconsciente por algo, uma escolha realizada sem saber por quê. Notemos que sempre ao elucidar um caso, a mesma se deprimia, por quê? Porque no fundo não havia encontrado a solução que tanto queria, a solução para a sua questão pessoal, não havia desvendado o seu fantasma e, quando isto por fim ocorre, sente-se aliviada com situação, ainda que morra após desvendar seu mistério, parece morrer em paz. As demais figuras que também enxergam e dialogam com os espíritos, tem em comum uma história de traumas e perdas, o que, neste caso, parecem ser a origem de suas visões, suas buscas por respostas, por algo.
Para encerrar este escrito, trago aqui uma reflexão a respeito de nossas escolhas e nossas angústias. Quantos e quantos fantasmas nos assolam vezes por outra. O que são? Nossas buscas, profissões escolhidas, e muitas vezes ré escolhidas em nossos trabalhos e estudos, o porquê as realizamos e porque muitas vezes não nos sentimos felizes pelas escolhas. Após um tempo, muitas vezes podemos perceber que o motivo de tais insatisfações estarem relacionadas ao fato de que desconhecemos o personagem principal de nossa história, por não sabermos o que buscamos por não conhecermos a nós mesmos. Mas o conhecimento de nos mesmos impõe uma viagem ao passado, impõe  encontrar-se com muitos de nossos tão temidos fantasmas, muitos não dão conta desta busca, escolhem outros caminhos, por mim, prefiro enfrentá-los. Conhece-los e saber com quem lidar me parece uma saída mais inteligente. Não fácil, reconheço, mas que vale a pena.






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