AS
INFLUENCIAS DO PENSAMENTO RELIGIOSO SOBRE O HOMEM SEGUNDO O FILÓSOFO FRIENDRICH
NIETZSCHE. ARTIGO DE REVISÃO.
Valter Fernandes Ferreira.
Resumo.
Este trabalho, tendo como base a obra do
filósofo Friedrich Nietzsche, passando rapidamente pela obra de Ruben Alves,
busca visualizar os impactos provocados pela teoria religiosa ao homem nos
processos de construção social ao longo da história, como surgiram as questões
morais, como foram construídos as bases religiosas as quais ainda se perpetuam
na sociedade atual, como os deveres morais a partir do pensamento religioso
trarão ao homem um sentimento de prisão, infelicidade, de um ser que abandona
sua própria vida por acreditar em uma vida futura.
Palavras-Chave: Religião, Igreja, Homem, Valores morais,
culpa, pecado.
Religião ou
religiosidade é algo que foi construído ao longo dos anos, as crenças já
existiam bem antes da histórica vinda de Cristo, porém, com o advento do
cristianismo, houve tempos em que os descrentes, sem amor a Deus e sem religião,
eram tão raros, que os mesmos se assustavam com sua descrença e a escondiam,
como se ela fosse uma peste contagiosa. (Alves 2011).
No
mundo animal, podemos observar como as espécies vão ao longo dos anos
carregando consigo características próprias de cada espécie, sua vida se
processa num mundo estruturalmente fechado, a aventura da liberdade não lhes é
oferecida, mas não recebem, em contrapartida, a maldição da neurose e o terror
da angústia. (Alves 2011), a partir deste pensamento, podemos notar que o
homem, através de uma constituição histórica, foi ao longo dos anos se
desenvolvendo num processo cultural, construindo o que hoje se conhece como sua
subjetividade, porém, através deste processo de construção, o mesmo construiu também
processos e regras as quais levaram no a aprisionar-se, a produzir para si uma
teoria que o leva, em muitos casos, a negar a si mesmo, sua existência e seus
extintos, sua vida cotidiana se baseia numa permanente negação dos imperativos
imediatos do corpo, os homens se recusaram a ser aquilo que, a exemplo dos
animais, o passado lhe propunha, tornaram se inventores deste mundo, (Alves
2011), o pensamento religioso demonstra e se posiciona como incentivo a negação
à vida, o mesmo ira determinar o que é certo ou errado, o que é moral ou imoral
a partir de sua teoria, fazendo com que o homem negue a si mesmo, negue sua
vida, por acreditar em outra vida. (Nietzsche 1887).
Partindo de sua visão a respeito da criação dos conceitos
morais, Nietzsche, filósofo do século XIX, debruça-se sobre o tema e busca
encontrar respostas para seus questionamentos, ele enxergará, na teoria
religiosa, o que se refere como sendo o grande perigo para a humanidade, relata
ainda estar possuido por um ceticismo profundo, uma desconfiança de que a moral
cristã seria a mais sublime tentação ao nada, algo que promoveria o começo do
fim, a vontade que se volta contra a vida, uma moral baseada na compaixão a
qual vai se alastrando cada vês mais e tornando doentes até mesmo os filósofos,
um caminho que levaria ao niilismo,
ou seja, ao nada, (Nietzsche 1887), desta forma, demonstra claramente sua
preocupação de onde chegaria esta valoração sentimental, o filósofo se mostra
enfaticamente contra toda teoria de amolecimento dos sentimentos, uma situação
que pode se apresentar como patológica, através do amolecimento dos sentimentos
o homem posiciona-se como um ser frágil, ele se coloca em posição de espera,
Deus é o responsável pela sua vida, um ser que aceita todo tipo de moléstia,
todo tipo de dominação, pois, o seu reino não é deste mundo, esta teoria
levaria o homem ao abandono do que de mais importante este possui, a vida, em
prol de outra vida, a qual não se sabe existir.
Em sua primeira dissertação o autor busca visualizar onde
surgiram os conceitos de bem e mal, bom a princípio não se referia àquele que
fez o bem, bom seria os nobres, Aristocráticos, os poderosos, superiores em
posição e pensamento, que sentiram e estabeleceram a si mesmo, ou seja, de
primeira ordem, em oposição se encontrava tudo o que era baixo, vulgar e
plebeu, (Nietzsche 1887), o bom, era aquele que era realmente bom no que fazia,
o que conseguia realizar suas obras, o forte, o guerreiro, e não o fraco, o
coitado, o humilde, não, definitivamente este não era o bom, porém ocorrerá o
que o autor se refere como transvaloração de valores, ocorre o declínio dos
valores aristocráticos, o surgimento do pensamento religioso, o sacerdote
asceta de forma hábil transformará, reverterá o conceito de bom, uma grande
reviravolta, o que o autor irá se referir como a mais espiritual vingança,
promoveram então a inversão dos valores, o bom deixaria de ser o nobre
aristocrata e passaria a ser os pobres,
impotentes, os sofredores, os necessitados, feios e doentes, estes são os únicos bons, a eles
caberá unicamente as
bem aventuranças, aos nobres e poderosos, estes se tornariam condenados
eternamente como cruéis, maus, ímpios, desventurados malditos e danados,
(Nietzsche 1887), neste ponto citado, podemos hoje notar traços desta filosofia implantada a partir do pensamento religioso, possuem caráter de
bondade todo aquele que despreza qualquer tipo de riqueza, aquele que abandona
seus desejos e anseios e se entrega à espera, espera de felicidade em uma outra
vida, ainda conforme o autor, seria realmente este o momento, um pensamento
originário da árvore do ódio judeu, que precisou de dois mil anos para alcançar
sua vitória, (Nietzsche 1887), ou seja, o momento vivido pelo filósofo no
século XIX, e que se estende até o momento atual.
Com o surgimento deste novo conceito de bondade, o
ressentimento torna-se gerador de valores, foi através de uma classe
ressentida, tomada de ódio que surgiu a transformação, enquanto o bom nobre se
baseia em si mesmo, o novo conceito de bondade se baseará na negação de si
mesmo, se acha ainda no direito de imputar ao outro esta obrigação, cria-se
algo a se apegar, ou seja, a alma, uma forma de levar o fraco o oprimido de
toda espécie a enganarem se a si mesmos, (Nietzsche 1887), através deste
pensamento, o homem viverá sua vida desprezando o corpo e seus prazeres,
preocupando-se em salvar aquilo que vai além do corpo, aquilo o qual irá para a
vida eterna, a alma, sua vida se baseia na fé, no amor, mas este amor na verdade
é o mais profundo ódio, por não conseguirem serem fortes como os nobres
aristocráticos foi que criaram esta inversão de valores, por não poderem ser
bom como ele, colocaram no então como o mau, o ruim o perverso, mas tudo isto
motivado pelo desejo de vingança, então o amor que se propaga, nada mais é que
o desejo de ser forte algum dia, sua esperança se dará no juízo final, momento
em que ocorrerá o gozo daqueles que tanto sofreram, momento em que se verá os
perseguidores do nome do senhor queimando nas chamas, (Nietzsche 1887), este
desejo de ver seus perseguidores sendo castigados, este amor então se mostrará
como a maior forma de ódio.
O desenvolvimento do pensamento religioso veio trazer ainda outro
problema ao homem, a formação de uma consciência, não no sentido de percepção
clara dos fenômenos, no sentido de má consciência, culpa perante Deus, certo ou
errado, a origem da responsabilidade, um animal capaz de fazer promessas, uma
tentativa de tornar o homem confiável, sua justificativa, a moralidade dos
costumes, da camisa de força, o grande golpe de gênio do cristianismo onde o
próprio Deus se sacrifica pela culpa dos homens, Deus, o único que pode redimir
o homem daquilo que para o próprio homem se tornou irredimível (Nietzsche
1887), desta forma o homem foi sendo domesticado, sendo colocado em uma linha
de raciocínio que o prende, que o prende a uma teoria tirana, dura e estúpida,
tal teoria imporá limites de sua via, sua base será o ascetismo, prega o
abandono dos prazeres mundanos, utiliza de recursos que hipnotizam o ser, que,
através da mnemônica, fixam seus ideais, todas as religiões são, no seu nível
mais profundo, sistemas de crueldade, (Nietzsche 1887), em alguns aspectos a
teoria religiosa se mostrará como cruel, principalmente nos momentos em que
sugerem ao indivíduo que abandone-se, que aceite este mundo como o mesmo o é,
que coloca-o em posição de espera, onde o mesmo será mero coadjuvante no mundo,
pois a vida, a felicidade, se dará em outro plano, sobrenatural, o reino dos
céus, onde reinara toda a glória eternamente, desta forma o homem passará por
esta vida como um ator em uma peça teatral, onde o mesmo exercerá um papel já
pré-definido, não sendo ele senhor de si mesmo, por outro lado, ainda que
contraditório, a teoria religiosa se mostrará importante em momentos onde homem
necessite se agarrar a algo, nos momentos de enfermidade a fé se mostrará de
grande importância, mas, neste momento, retornaremos a afirmação do filósofo de
que o homem escolherá o nada por não ter nada melhor a escolher.
Assim se criou no homem o sentimento de culpa, uma cultura
doentia que somente poderia ser cuidada por médicos doentes, afirma o autor,
ele mesmo tem que ser doente, tem de ser aparentado aos doentes para entendê-los,
mas também tem de ser forte, ainda mais senhor de si mesmo que dos outros,
inteiro em sua vontade de poder, para que tenha a confiança e o temor dos
doentes, (Nietzsche 1887), assim se manifesta o sacerdote ascético, o
sentimento de culpa, o pecado, estes sentimentos tornaram o sujeito doente, uma
doença a qual não se deseja curar, estes doentes serão organizados em uma
concentração, a palavra mais propícia para tal seria Igreja, (Nietzsche 1887),
dentro da Igreja o homem acreditará que o mesmo é parte integrante de uma
natureza pecaminosa, porém a natureza pecaminosa não faz parte da essência do
homem, ela nada mais é que uma interpretação dos fatos, visto sob os olhos da
moral religiosa que impera sobre o ser, o fato de o homem se sentir pecador não
justifica que ele se sinta assim, como exemplo clássico podemos nos recordar da
cassa as bruxas promovida pela igreja na idade média, os mais célebres juízes
não duvidaram de que as bruxas eram culpadas, nem mesmo elas duvidavam,
portanto, como disse o autor, e como hoje claramente sabemos, não havia culpa.
As religiões, conforme afirma o autor, foram responsáveis
pela criação do sentimento de culpa que o homem carrega sobre si até os dias
atuais, um fardo pesado, diga-se de passagem, hoje, século XXI, notamos o
quanto o discurso moralista encontra-se infundido na sociedade contemporânea,
propício seria destacar neste momento as discussões que circulam pela mídia
sobre os relacionamentos homossexuais, sobre sua legalização, sobre o direito
que os mesmos possuem a união estável e à adoção de crianças, este grupo ao
qual me refiro, é passível de discriminação por parte da sociedade, esta
discriminação geralmente virá oculta através do discurso `` Não sou contra,
somente tenho o direito de não concordar ´´ outros diriam, `` Jesus ama o
pecador, só não ama o pecado ´´, assim se justifica aqueles que defendem este
pensamento, uma cultura de discriminação que poderá ser notada em diversos
meios sociais, inclusive no ambiente acadêmico poderá ser notado sua presença,
tal cultura, tem sua origem nas bases as quais foram constituídos os
pensamentos morais, ou seja, a religião.
A cultura do pecado inserida no mundo, o sentimento de culpa,
a causa do sofrimento, estamos condenados a esta visão de doentia durante
alguns milênios, jamais nos livraremos dele? Por onde quer que nos voltemos, em
toda parte, o olhar hipnótico do pecador movendo-se na mesma direção, o
sentimento de culpa (Nietzsche 1887), a consumação de um pensamento que, a
partir do ideal ascético, melhorava o homem, já não havia mais queixas pela dor
ou pela miséria, afirma neste momento o autor não discordar desta melhora do
homem, porém, para o mesmo, melhora neste contexto significa, domesticado,
enfraquecido, lesado, alienado, um sistema que torna o doente invariavelmente,
mais doente, ainda que o torne melhor, (Nietzsche 1887).
O ideal ascético, o pensamento religioso, teve como seu
principal objetivo, dar um sentido a vida do homem, portanto, se desconsideramos
este ideal, o homem, animal que é, não possui até então sentido sobre a terra,
sua existência não possuía finalidade, afirma o autor,`` para que o homem?´´,
era uma pergunta sem resposta, o homem não conseguia se justificar, se
entender, se tratava de um ser doente, que sofria, porém, seu problema não era
o sofrimento, era, outrossim, a falta de sentido de para que sofrer, a falta de
sentido para o sofrimento era até então a maldição que assolava a humanidade,
foi no que se estabeleceu todo o pensamento religioso, fornecer à humanidade um
sentido para o sofrimento, sendo até então o melhor sentido encontrado, a
ciência, a qual veio a questionar posteriormente o ideal acético, não foi até
então capaz de oferecer um sentido melhor, desta forma ganhou espaço este
ideal, o sofrimento sendo justificado
pela culpa, o homem não era mais uma folha ao vento, ele podia querer algo,
ainda que este algo se fundamentasse no niilismo, esta forma de interpretação,
segundo o autor, trouxe ao homem um sofrimento maior que o anterior, pois seu
sofrimento baseia-se na culpa, no abandono da vida, abandono dos prazeres, mas
em prol de que? Do nada, voltando assim ao que de inicio já se dizia: `` O
homem preferirá o nada por não ter nada melhor a querer ´´. (Nietzsche 1887).
CONCLUSÃO.
As religiões se mostraram como sendo
as genitoras de muitos dos processos morais aos quais estamos submetidos nos
dias atuais, a partir de um determinado ponto de vista, pode se visualizar este
fator como positivo, pois contribuem de forma fluente para a manutenção da
ordem social, contribui ainda para o desenvolvimento e aperfeiçoamento das
relações visto que, a base da vida religiosa, se dará em comunidade, este fato
promoverá um estreitamento de laços e fará com que as pessoas se aceitem mais
umas as outras, como diz um dos fundamentos religiosos, ``Amai-vos uns aos outros´´,
por outro lado, o pensamento religioso trará ao homem diversos pensamentos,
doutrinas, que poderão produzir neuroses ao mesmo, como por exemplo o
sentimento de dependência, negação à vida, sentimento de culpa, remorso, etc. O
sentimento de dependência, fará com que o homem aceite muitas vezes a vida e as
injustiças sociais como ao normal, Deus é a providencia e na hora certa ele
olhará por mim, o sofrimento será em prol da salvação, negará assim a vida, seu
mundo não faz parte deste mundo, neste mundo perpetua o pecado, a culpa pelo
pecado que foi introduzida pela religião, cria no homem um ressentimento,
neurose, o que o levará a negar muitos de seus instintos, pois, a moral cristã
não lhe permite ser livre, prisão, remorso, sentimentos recalcados que, uma vez
estabelecidos no inconsciente, podem vir a se manifestar de forma patológica,
assim se mostra a criação dos conceitos morais produzidos pela Igreja, uma
teoria que produziu uma doença ao homem, uma enfermidade que se alastra e
contamina ainda o homem pós moderno, levando-o a negar sua vida e a se sentir
no direito de imputar seu princípio ao outro, produzindo teorias
discriminatórias, com base em um livro escrito em um outro período da história,
encontram motivos para se explicar fatos de um outro tempo, cria-se hábitos
homofóbicos e pouco tolerantes para com aqueles que possuem um outro estilo de
vida ou pensam diferente, ainda que camuflado, esta é uma realidade existente, dependendo
do nível de desenvolvimento, estes acontecimentos podem atentar para aquilo que
o homem realmente sabe ter, a vida.
Referencias
Bibliográficas.
ALVES,
Rubem. O que é religião. 12ª Edição, Junho de 2011, Edições Loyola.
NIETZSCHE.
Friedrieh Wilhelm. Genealogia da moral, Uma polêmica. 1887. Editora
SchwarczLTDA.
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